O Cante Alentejano é usualmente definido pela estrutura melódica e o tipo de organização performativa que o caracteriza, ou seja, o canto polifónico executado em grupo e sem instrumentos. Divididos entre o Ponto, o Alto e as Segundas Vozes, um grupo de cante alentejano tem como repertório as "modas" que versam, entre outros temas, sobre o trabalho, o amor, a contemplação e a nostalgia. Outras caraterísticas que o distinguem são: a lentidão, a moderação das acentuações, os melismas e certas anomalias harmónicas.
Na sua forma original, AS MODAS tinham como temas principais O TRABALHO, A CONTEMPLAÇÃO, A NOSTALGIA, O AMOR e A VIDA. Mais do que reivindicar melhores formas de vida, o cante servia para se purgarem as dificuldades. Com o declínio da economia agrícola e depois da revolução de 1974, os grupos corais introduziram nos seus reportórios novos temas, alguns inspirados nos acontecimentos políticos da época, mais reivindicativos, não deixando, porém, de cantar as antigas modas do cancioneiro popular.
A taberna é o lugar onde os homens se juntam para conviver e cantar. Vedado às mulheres durante décadas hoje já não é tão rígido. É mais uma questão de gosto. A taberna continua a ser um "clube para homens" mas a mulher é bem vinda.
As origens do Cante perdem-se no tempo. No entanto, existem três teorias principais:
Na imagem: CORO MEDIEVAL, 1479. Xilogravura 'Der Spiegel des Menschlichen lebens,' Augsburg, Alemanha, 1479.
O legado cultural da presença muçulmana em Portugal
Na imagem: Manuscritos Magrebinos / A História de bayad e Ryad / Bayad canta com alaúde diante da amada e dos seus servos / Séc. 13 / 17.5 × 19.2 cm / Biblioteca Apostólica do Vaticano
Originalmente portuguesa e alentejana. Anterior à ocupação romana e muçulmana.
Na imagem: Dolmen
O cante alentejano era uma manifestação informal, espontânea que acontecia no campo. Marca um movimento lento, o ritmo, a cadência do trabalho à jorna, nomeadamente das colheitas que mais caracterizavam a agricultura alentejana - a ceifa, a monda e a apanha de azeitona.
Com o cante estimulava-se a competição entre trabalhadores, o cante colectivo projectado em uníssono dava o mote para homens, mulheres e crianças darem o seu melhor nas tarefas agrícolas. Entretanto, com o advento das empreitadas agrícolas, alteram-se os ritmos de trabalho e o estimulo do cante deixou de ter a importância que tinha nas tarefas do campo.
Os alentejanos são os escolhidos para as melhores anedotas - normalmente relacionados com o ritmo lento.
É vinculada a ideia de que o cante alentejano é uma prática masculina. Na sua origem o cante alentejano era prática não só dos homens como das mulheres, ambos trabalhavam no campo, ambos protagonizavam essa prática cultural. Com o declínio da economia tradicional agrícola, com a passagem do cante do campo para as tabernas e, a partir dos anos 30, quando se constituem os primeiros grupos corais formais, silenciam-se as mulheres que até então desempenhavam um papel tão importante como os homens no cante alentejano.
Quando as mulheres
deixam de ter acesso ao local onde, de modo privilegiado, o cante passa a acontecer – nas tabernas – estas ficam privadas do seu papel de intérpretes. Só depois de 1974, com a revolução de Abril, com os novos movimentos sociais e culturais, as mulheres voltaram a cantar organizando-se em grupos corais femininos ou mistos.De salientar a existência de vários grupos corais na cintura de Lisboa, situação que advém da diáspora, os alentejanos que saem dos seus locais de residência e partem à procura de novas oportunidades junto da capital, o cante viaja do campo para a urbe, do meio agrícola para o meio industrial. Numa versão preliminar do "Inventário-catálogo dos grupos de cante alentejano", um documento de trabalho redigido por Paulo Lima, em 2012, para a proposta de candidatura do Cante Alentejano à lista representativa do património cultural da humanidade a apresentar à UNESCO, são enumerados 250 grupos corais, destes 140 encontram-se, actualmente, em actividade e 30 pertencem à diáspora. No mesmo documento realça-se o aumento do número de grupos corais após 1974, grupos estes associados às Unidades Colectivas de Produção e às Autarquias Locais.
Texto Adaptado de: Sousa, Filomena (2011), "O Cante Alentejano e os Ceifeiros de Cuba", Projecto Memóriamedia, Porto: Memória Imaterial/IELT, artigo revisto, 2ª edição, pp. 1-12. Programação: Carlos Raposo